quarta-feira, 6 de abril de 2011

Amores e revoluções, no plural, mesmo!‏

Amores e revoluções, no plural, mesmo!‏



Tenho passado as noites, há algumas semamas, na casa da minha mãe, de 84 anos, que anda baqueando em saúde física. Entretanto, quanto às memórias, sua saúde mental já não tão perfeita ainda dá mostras de conservar lembranças fortes, como constatei durante a apresentação do primeiro capítulo da novela "amor e revolução", no SBT, a que assistimos juntas, em meio a uma pluralidade impossível de controlar.






Os sentimentos vieram aos borbotões, ela disparava frases sobre aqueles dias de 64, em que eu tinha 14 anos e ela 36, o quanto ela acompanhava noites adentro as transmissões da rádio da legalidade, com a voz forte e inesquecível do gaúcho Leonel Brizola a pregar o estado de direito e a permanência do presidente Jango no poder. Revivemos as questões familiares. Tio preso e sumido que era líder metalúrgico na Fábrica Nacional de Motores, meu pai perseguido no trabalho, por meses a fio, os vizinhos que nos estranharam, proclamando a vitória dos militares e dali por diante uma sucessão de fatos aos quais nos acostumamos a conviver. Nas esquinas, desde o subúrbio carioca onde morávamos, a caminho do centro, onde eu e meu irmão cursávamos o ginasial, nas esquinas, aparatos militares, muita boca fechada, muito medo e a sensação de que o país virava de cabeça para baixo.






No colégio, conversas sussurradas com coleguinhas mais conscientes, tentativas de compreensão e a certeza da ditadura que se instalaria e faria parte da nossa história por longo tempo.






Amores? era o nosso tempo de iniciá-los, a começar pelos jogos amorosos entre adolescentes sonhadores e indo ao encontro dos conceitos de amor à Pátria que o Colégio Pedro II tão magestosamente nos incutia através de paradas ocasionais, marchas em solenidades rotineiras, cantorias de hinos ufanistas, aulas inesquecíveis de história e geografia do nosso país imenso e rico.






Revoluções? centenas delas dentro dos nossos corações e atormentando nossas cabeças. Um ir-e-vir e informações truncadas, censuradas, mentiras, verdades camufladas, os próximos anos, tentativas de resistência, o fenômeno do militarismo acima da legalidade, o exílio de tantos, o desaparecimento de outros tantos, as torturas, as perseguições, um inferno sob a égide de um sol maravilhoso, tropical, os anos 60 escoando, a dureza do AI5 em dezembro de 68, a conquista da famosa Copa do Mundo em 70 e o mundo rondando em torno de novos ideais, resgate democrático, direito de votar, diretas já, em pouco mais de 15 anos, dentro de nós, mil amores e mil revoluções.






Pois a novela está só começando. Parece que vai misturar tudo num fervente caldeirão. Tomara que sirva para esclarecer e elucidar às novas gerações. Tomara que honre a memória dos tombados e desaparecidos, e que ajude a repassar e repensar período tão obscuro da vida brasileira.






Enquanto isso, eu e minha mãe, permanecemos juntas, testemunhas das nossas sentimentalidades e lembranças, diante de uma televisão capaz de transmitir episódios fortes, atingindo ainda que tardiamente, corações que se surpreendem frágeis, apesar das décadas que ficaram para trás. Daqui para a frente, um Brasil novo nos impele a festejar... é que acreditamos piamente...






Maria Aparecida Torneros

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