O século da mulher

                                                             Nizan Guanaes*
       Na noite do dia 13 de setembro, em Nova York, Tina Brown, uma das maiores jornalistas dos Estados Unidos, lança sua Women in the World Foundation. A Fundação Mulheres no Mundo visa mobilizar o mundo em torno dos problemas das mulheres e mobilizar as mulheres em torno dos problemas do mundo.
O que não falta no mundo de hoje são problemas enormes, e em muitos deles a mulher é o caminho mais curto e eficiente para resolvê-los. Como resolver o problema das drogas, da obesidade infantil, da Aids ou da gravidez precoce sem engajar a mulher?
Como expandir o microcrédito ou cobrar a melhora da qualidade de ensino sem o apoio da mãe de família? Como controlar a natalidade, questão fundamental num mundo sufocado, sem envolver a mulher? Dos dez maiores problemas da atualidade, na maioria deles a mulher é a solução. É a mulher quem organiza o lar, a família. Promover o desenvolvimento educacional e social da mulher é injetar desenvolvimento e prosperidade na veia.
Como filho, como marido, como padrasto e como amigo de grandes mulheres, abraço essa causa com absoluta convicção. O desenvolvimento das mulheres no mundo inteiro é o caminho mais rápido para o desenvolvimento do mundo. E a situação da mulher no mundo ainda é de absoluto desrespeito. Tratadas como bichos e escravas, trancadas em quartos e debaixo de burcas, exploradas sexual e economicamente, humilhadas e reduzidas, as mulheres no mundo estão longe das esplendorosas e emancipadas mulheres do cinema, das novelas ou das revistas de moda.
Flagro-me, às vezes, em piadas sexistas que são fruto de 53 anos e da sociedade onde nasci e cresci. E aquele pequeno Carlos Imperial que há dentro da minha idade só não se desenvolve porque, ao primeiro ato falho, ele apanha da Donata. É munido dessa consciência, desse mea-culpa, e dessa imensa fé no potencial transformador da mulher que me engajo na Women in the World Foundation.
Minha mãe, hoje com mais de 80 anos, se formou em engenharia civil em 1957, na Bahia. Foi uma visionária. E seus olhos visionários se tornaram meus.
Mesmo tendo ela nascido no Pelourinho, esses olhos sempre foram globais… E me ensinaram a não ter medo do mundo. Militante de esquerda, minha mãe me ensinou a compreender mais amplamente a história longe do sistema de castas da sociedade aristocrática da Bahia do meu tempo. Ela foi a primeira pessoa a me falar sobre o futuro da China (isso na década de 1970) ou sobre o Peter Drucker, o guru da gestão.
Hoje, ela enfrenta a grande noite do Alzheimer. Mas, se ela já esqueceu de tudo o que ela foi, nunca esquecerei o que ela representa. E, através de mim e de meus filhos, ela deixa sua marca no tempo. Sou eu quem escreve este texto, mas a caligrafia é dela. É por isso que acredito que, cuidando de cada mulher, escrevemos e reescrevemos milhões e milhões de histórias. Mas, para fazermos isso, é preciso mudar o padrão mental de nossa sociedade.
Independentemente da política partidária (virei ateu nessa área), o Brasil já deu um grande passo na política de gêneros ao eleger uma mulher presidente.
E acertarão a publicidade e as marcas que tiverem um entendimento claro da mulher, de seu novo papel e de seu imenso potencial. Dona Maria, a Malu Mulher da base da pirâmide, não quer só os produtos da cesta básica. Dona Maria quer beijar, quer ser jovem, quer unha bonita e o cabelo da Gisele.
E a filha da dona Maria quer falar inglês, trabalhar na Vale ou na Petrobras, ser transferida para uma subsidiária da companhia no exterior e trabalhar num projeto social da empresa para que outros filhos de dona Maria tenham a mesma chance que ela. Entender os anseios da cidadã, da mulher, da mãe, são desafios dos homens públicos, dos empresários, dos homens de marketing e de todos nós, homens em geral.
Tenho certeza absoluta de que, se algo pode mudar radicalmente o mundo e transformá-lo em um lugar mais justo e melhor de viver, esse algo é a mulher.
*Nizan Guanaes é publicitário e escreve na ‘Folha’.